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domingo, 23 de outubro de 2016

O Gênio Zé de Graça ( cap. 23)


Dispensado da guerra, acompanhou cada acontecimento , ouviu no rádio a voz sentida e solene do imperador Hirohito; declarando a rendição do Japão na segunda grande guerra em agosto de 1945. Tudo isso após a explosão de duas bombas nucleares. A humanidade jamais seria a mesma, pensou Zé de Graça com seus borbotões. Estava ali atento aos fatos e passou se se tornar cada dia mais reflexivo acerca da vida. Passou então a uma fase existencialista onde fazia sérios questionamentos às vésperas de tocar as trombetas da década de 50. Era um homem interrogativo mas não havia ninguém, absolutamente ninguém para dividir suas indagações metafísicas acerca da vida. Sentia-se por isso triste e diferente. Foi ai que conheceu uma jovem que veio a ser sua esposa, que mesmo apesar de não possuir conhecimentos e nem leitura, tinha com ele uma enorme afinidade espiritual. Então passou a dividir com ela seus momentos, momentos de prazer sem ser taxado de louco. Ele e ela, mesmo diante de toda a pressão dos falsos moralistas que existiam e existem em toda parte, em Frei Paulo, não seria diferente. Resolveram viver o amor. E assim, casaram e viveram em harmonia por muitos anos , sem ter filhos. E foi em meio ao clima de muitos avanços científicos que vieram depois da guerra que pode se aprofundar nos estudos e exercer suas atividades, sempre voltadas para a ciência.
Mas no fundo tinha um enorme orgulho de si mesmo, principalmente por não pensar igual aos idiotas e de não levar uma existência medíocre sem sonhos e sem aventuras. Aumentou então sua fé em Deus e passou a ser mais religiso, frequentando a missa assiduamente O fim da guerra foi motivo de muita alegria , sentia-se triste em ver essa realidade “Os homens de todas as nações estão armados até aos dentes, para entreassassinarem-se entre si, feitos imbecis.” Então resolveu meter a cara na vida e simplemente viver. Buscar os livros e as experiências e se entregar ao amor . Zé e Joaninha viveram isolados no próprio mundo deles e não resta dúvida que foram muito felizes, Se fosse dar ouvidos as conversas e fofocas comuns na província estaria fadado à solidão. Mas por mais intima e sedutora que fosse essa convivência , alguma coisa faltava e Zé se debruçava mais uma vez sobre o seu primeiro projeto científico, o sistema propulsor de andores , então por anos rondou a sacristia , sempre solícito ao novo pároco no afã de ver realizado sua obra. O sistema era para ser aplicado não só na festa de São Paulo mas em qualquer procissão, dispensando o uso de mãos humanas para conduzir as imagens sagradas da santa igreja católica.
Ficou muito amigo do padre João Lima, mas nunca encontrava o momento ideal para apresentar o projeto, o padre João era um verdadeiro furacão e não parava um minuto, estava sempre em busca de realizar novos projetos sociais e pouco tempo tinha para ouvir os devaneios de Zé de Graça, sempre alheio às escaramuças políticas daquela época.

segunda-feira, 17 de outubro de 2016

O Gênio Zé de Graça ( Cap. 22 )


Numa manhã ensolarada de dezembro Zé de Graça que era quase um celibatário passou a sofrer constante assédios sexuais de uma coroa balzaquiana , moradora da rua de Itabaiana. Era um jovem elegante e solteiro e adentrava com frequência os lares para realizar qualquer tipo de reparo. Então esta senhora recatada que costumava ir à missa com um vel sobre a cabeça e rezar por horas à fio e por fim sorver com sua língua de serpente a óstia das mão dadivosas do padre João Lima. Na missa, um certo dia ela sentou ao lado de Zé de Graça, mas tão próximo que este ficou meio sem graça afinal a timidez era um dos traços mais fortes de sua personalidade. Dona Gertrude morava ali com uma prima professora e ao que parece já tinha ficado pra titia. É certo que Zé de Graça era solteiro nessa época e como todo jovem tinha a mente povoada por desejos insondáveis. O seu forte sempre foi a discrição, cuidadoso no falar e agir. Um belo dia quando caminhava pela praça, próximo ao coreto, foi abordado por D. Gertrude. – Sabe o que é Zé? É a minha cafeteira que tá esquentando demais, passe lá em casa pra dar uma olhadinha, disse ela com um sorriso malicioso nos lábios. Zé se prontificou a ir no dia seguinte pela manhã. E assim às 10 horas de um domingo ensolarado de 1960, chamou na residência de D. Gertrude. Do interior da casa uma voz lânguida ecou naquele mesmo instante. Pode entrar.
Zé entrou na casa que tinha mosaico quadriculados, cuidadosamente encerado e uma mobília colonial, antiga com centros, baús, cristaleiras e dezenas de bibelôs espalhados por todo lado. Na sala D. Gertrude ofereceu logo um refresco de pitanga e se insinuou toda perfumada usando um vestido negro provocante. Zé tomou o refresco de um só gole e desconfiado de tanta gentileza, perguntou pela cafeteira e ela disse : Está naquele quarto espere um momento. Então a mulher entrou no quarto e alguns minutos depois o chamou. Mas este ao entrar, se deparou com uma cena inusitada. D Gertrude deitada na cama sem roupas e proporcionando um espetáculo que o deixou de queixo caído. A enorme genitalha cercada de pelos grossos como arames tão fartos como a mata de Sizino sendo manuseada com maestria por dedos ágeis enquanto ela soltava gritos e sussurros e dizia olhando fixamente nos seus olhos: - Veja Zé como está quente. Pelo amor de Deus dê um jeito nisso. O cheiro demoníaco de sexo impregnou suas narinas e até suas roupas.
Diante daquela visão tão inesperada Zé de Graça teve uma tremedeira e ficou estático, mas em seguida voltou a si e saiu em disparada pelo corredor da casa, branco, sem sangue, ofegante , estava morto de vergonha. Jamais ele comentou com ninguém o que havia acontecido. Levou para o túmulo esse inconfessável segredo de alcova Nos dias seguintes encontrava D. Gertrude na missa e esta lhe sorria sempre com a costumeira malícia, mas recatada era a primeira a entoar as ave marias e a puxar as rezas na igreja, sempre recatada e contrita.

domingo, 16 de outubro de 2016

O Gênio Zé de Graça ( Cap 21 )

O rádio naqueles dias de absoluta tensão era a atração de todos os instantes e era comum ver personagens da vida freipaulistana andarem com eles a tiracolo, seja em frente a uma bodega ou bar e chamar a atenção com as últimas notícias sobre a guerra. O temor era geral mesmo o país sendo governado por um regime ditatorial alinhado com o fascismo, o estado novo getulista. O Sr Joaquim, homem já idoso,de hábitos taciturnos, naquele dia abriu o volume do seu possante rádio, e naquela manhã quente do mês de fevereiro de 1942, o locutor narrava com destaque o torpedeamento de embarcações brasileiras pelos alemães em represália a adesão do Brasil à carta do Atlântico. Zé de Graça encostado à parede ouvia atentamente ao noticiário, mas ao invés de apreensão demonstrava curiosidade e desconcertante indiferença ao temor da maioria em participar dessa guerra.
Alguns anos depois em outubro de 1944, recebeu um telegrama para se apresentar imediatamente para ao lado de outros conterrâneos integrar a Força Expedicionária Brasileira. Foi tomado por uma grande alegria e empolgação. Abandonou a roça e o emprego de motorista e no dia seguinte às 5 horas estava ao lado do colega de estudos de música que tanto admirava, João de Santa. Enquanto Zé mostrava-se animado e disposto na nova empreitada o amigo estava extremamente angustiado e sua tristeza era por abandonar sua roça e sua banca de vender cachaça em Carira, ocupações que davam sustento a seus avós de mais de noventa anos, sob seus cuidados que teriam que ficar para trás. Teve que colocar a sua mãe para tomar conta dos idosos A marinete roncou na ladeira da Imbira deixou Frei Paulo para trás e os jovens seguiram para Aracaju, mas ao passar pelo Cafuz as lágrimas rolavam na face do caboclo enquanto declamava alguns versos.
Zé um afoito desbravador e exímio no manuseio de armas, ao passo que o amigo era um poeta que dotado de muita sensibilidade e saudosismo sofria em ter que deixar seus pais e sua música a maior de suas paixões e lutar numa guerra insana. Anos de estudo de teoria musical e logo naqueles dias prestes a pegar o instrumento, teria que aprender a manejar um fuzil e matar pessoas. Ao contrário , Zé de Graça com toda sua timidez, tinha no interior da sua alma muita quietitude, mas também um sangue quente e coragem para embates , qualidades reservadas ao guerreiros. Era um homem de dois extremos. Enxergava na guerra a chance de ouro de pilotar grandes bombardeiros e dominar a tecnologia aeroespacial.
Apresentaram-se no Exército, ambos foram dispensados e voltaram para Frei Paulo, João de Santa não cabia em si de tanta felicidade, outros não tiveram a mesma sorte e levados para a Italia , não voltaram nunca mais . Cerca de 25 000 homens, de um total inicial previsto de 100 000 foram para os campos de batalha. Mesmo com problemas na preparação e no envio, já na Itália, treinada e equipada pelos americanos, a FEB cumpriu as principais missões que lhe foram atribuídas pelo comando aliado. Zé de Graça ainda insistiu com alguns oficiais para ser enviado as frentes de batalha, entretanto, estes o dispensaram .

O Gênio Zé de Graça ( cap.20 )


Ao se embrenhar pelo mato, numa fuga alucinada, foi dar com os costados no pé da serra. Cansado e ofegante olhava para os lados assustado e sentou numa pedra para descansar, mirando as estrelas e a lua minguante. Em pouco tempo, enquanto refletia sobre o que aconteceu, estava cochilando pois no seu rosto soprava uma leve brisa. Mas isso durou pouco mais de uma hora,sentia por sobre seu corpanzil branco insetos caminhando e instintivamente com a mão os tirava e jogava para o lado enquanto ressonava alheio ao perigo. Despertou com dezenas deles sobre o corpo e também no rosto. Então colocou um na palma da mão e com o tênue clarão da lua pode ver atentamente do que se tratava: enormes escorpiões vermelhos, venenosíssimos. Ainda meio sonolento, soltou um grito tão alto que foi ouvido em toda a Chã e saiu em disparada no meio da campina só parando próximo à malhada de Diógenes. O susto foi tão grande que esqueceu por um instante as luzernas.
Chegou na beira da estrada e teve medo, cético não acreditava em fenômeno paranormal , sabia apenas que aqueles acontecimentos apenas dariam a ele a oportunidade de uma acurada investigação científica. Era questão de honra desvendar o que aconteceu, quando a escuridão se foi a manhã surgia com uma neblina que cobria tudo. Caminhou pela estrada todo arranhado e com os pés sangrando até chegar à cidade. Encontrou o amigo Francisquinho e foram à cavalo resgatar a fóbica. Em pouco tempo ele consertou o automóvel, foi um defeito em uma bobina, disse ele ao Francisquinho.
Após isso Zé voltou várias vezes à noite ao local da aparição para ver o fogo corredor e chegou a ver novamente. Então descobriu em suas pesquisas tratar-se de um fenômeno muito conhecido no interior do Brasil, principalmente no Nordeste, são certas “luzes” ou “bolas-de-fogo” , chamadas em certas regiões de “Boitatá”, “Fogo-fátuo” ou “Fogo-corredor” (como é conhecido em Sergipe); Essas “bolas-de-fogo” percorriam o céu numa velocidade incrível, ora aparecendo muito próximas, ora muito distantes, por vezes batendo umas nas outras soltando faíscas.
Acabou descobrindo certo dia, uma explicação plausível para esse fenômeno, quando era abordado sobre o que aconteceu ele sorria com o canto da boca e dizia: isso é conversa do povo. Estudioso, Zé investigou e descobriu o que de fato acontece com base em estudos modernos que relacionam a aparição dessas luzes com OVNIS (Objetos Voadores Não Identificados), justamente pelo fato da região da Serra Redonda ser rica em minérios, principalmente urânio, material este que, segundo os ufólogos seria o combustível das “espaçonaves”. A Ufologia, ciência que estuda esses fenômenos, desmistifica muitas crenças populares criando outras, visto não haver um reconhecimento oficial da existência dos mesmos por parte das autoridades. Seria muito egocentrismo da humanidade julgar-mos que estamos sozinhos no Universo. As evidências estão aí para quem quiser ver e julgar por si mesmo. Assim pensou e falou o gênio Zé de Graça.

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

O Gênio Zé de Graça ( Cap. 19 )

O Gênio Zé de Graça ( Cap. 19 )
Aos 23 anos Zé de Graça já era um motorista tarimbado e naquela tarde de sábado recebeu um convite de Sá Benígna e seu esposo Francisquinho Ferreira para levar um lote até Ribeirópolis pois o mesmo pretendia negociar uns couros de boi com alguns catingueiros da região. A tarde já embalada no dorso do dia já beirando as 15 horas, na praça do mercado girava a manivela no afã de funcionar a velha fobica . Sá Benigna se aproximou dos dois e advertiu para não regressarem a noite dessa empreitada porque havia rumores de acontecimentos sobrenaturais naquelas bandas principalmente na antiga estrada que ia dar na Capela do Rastro. Teimosos e torrões os dois seguiram viagem buzinando e assoviando em meio ao frenesi das crianças que seguiam gritando e sorrindo enquanto o automóvel já ganhava velocidade atravessando o bêco do Mamão. Chegaram a Ribeirópolis as 17:30 e Zé foi tomar um café num botequim enquanto Francisquinho negociava o lote de couro. Otavio o comprador era casado com dona Valda e esta trouxe ao vendedor compotas de doce de leite e banana, ele comia e bebia água fresquinha do pote quando D. Valda advertiu. -Já está escurecendo, você e seu motorista devem dormir por aqui na Pensão, ali naquela estrada está acontecendo coisas estranhas, o povo está sendo perseguido pelo fogo corredor. Conversa do povo Valda, disse Otavio enquanto admirava os couros estendidos sobre o pátio do trapiche. Tenho medo dessas coisas não, disse Zé de Graça sorrido para a madame. D. Valda ainda disse onde tem fumaça há fogo! Deixa de bestagem mulher disse Otávio enquanto pagava a encomenda com notas novinhas.
Então os dois resolveram voltar para Frei Paulo quando o crepúsculo já se despedia a escuridão dominava a estrada. Mas assim que desciam a ladeira da Serra Redonda , a fóbica deu um defeito e estancou, os dois no meio daquele breu. Tá com medo Zé? Eu não. Tratou de fazer o conserto com o tato pois nem um candeeiro levaram. De repente um clarão surgiu na frente deles duas enormes bolas de fogo brigavam e quando se batiam voava faíscas que chegou a queimar o bigode de Francisquinho. Foi tudo muito rápido.Um correu para o lado direito da estrada e o outro para o lado esquerdo. As enormes bolas de fogo ficaram indecisas sem saber a quem perseguir. O clarão era tão intenso que parecia o meio dia em plena noite. O dia amanhecia quando os dois esbaforidos e com as roupas rasgadas chegaram à cidade contando a experiência que tiveram com o tal fogo corredor. Já era o dinheiro da venda dos couros.
De acordo com relatos dos mais velhos, se um homem fornicasse com sua comadre (fato inadmissível pela tradição católica), ambos se transformariam no “Fogo-corredor”, assombrando a população sertaneja durante a noite. Em outras regiões, principalmente no Sudeste, acredita-se que a mulher que comete o pecado da fornicação com um padre ou frade, é amaldiçoada a se transformar em “mula-sem-cabeça”, assustando os viajantes noturnos. Diga-se de passagem, que com tais lendas e superstições, as sertanejas pensavam duas vezes antes de traírem os maridos. Cansados voltaram a cavalo ao local e Zé de Graça consertou a fóbica e trouxe para Frei Paulo.