O jovem branquelo do alto da torre da igreja já contava 18 anos e a altura exercia sobre ele uma magia , algo que parecia parte de si mesmo. Naquela idade enquanto outros rapazes pensavam em namorar ele detinha-se no aprendizado da mecânica e com isso ia dia a dia juntando suas ferramentas e praticando suas experiências secretas. Desenhava protótipos de motores, todos eles fundamentados em aperfeiçoamento do que já existia há poucos anos da primeira grande guerra. Aproveitava um laivo de distração do padre para sorrateiramente ganhar as escadarias e subir subir subir ao seu refúgio. A torre estática sem movimento mas que produzia uma visão colossal de norte a sul onde mirava cada ângulo demoradamente. Ao sul a Serra de Itabaiana, a leste a Serra da Miaba e a sudoeste a Serra das Campinas com seus tons azulados acalmava sua alma aflita. O vento balançava a velha camisa Volta ao Mundo e as horas se esvaiam. Tão furtivamente quanto adentrava aquele território sagrado o deixava sem que ninguém percebesse. Divagava estudando temas como balonismo, aviação ,dirigibilismo. Inspirado nas proezas de Albert Santos Dumont, Zé de Graça começou experiências de dirigibilidade. Ansiava por poder controlar o voo, e para isso desenhou uma série de balões alongados dotados de lemes e motores a gasolina. Sentia nos seus longos ossos que construir sua própria aeronave e poder voar seria uma questão de tempo. Assim voltava para casa e não conseguia dormir mergulhado em devaneios de inventos e fórmulas. Muitas vezes o sono o vencia quando os primeiros raios de sol adentravam o quarto. Estudava exaustivamente os motores e seus sistemas de propulsão e número de cavalos de potência e como aperfeiçoar sob o dilema de diminuir o peso e aumentar a potência. Algo extremamente distante da realidade da mecânica que vivia no dia a dia nas usinas de beneficiamento de algodão dando manutenção e consertando os rudimentares motores cabeça quente. Era chamado assim porque para funcionar precisava aquecer o pistão com um maçarico. Detinha-se nos balões lançados a partir de 1900 e sonhava em deixar Frei Paulo e morar na França. Quem sabe assim conquistar os prêmios Deutsch com motor cilíndrico de 16 cavalos-vapor adaptado a um dirigível. Mas decidiu esquecer, pois temia a fama internacional e certamente o dinheiro que iria atrapalhar mais que ajudar nos seus projetos futuros. Decerto que pouca coisa do que era pedido era inédita. Inventores, em outros países, já haviam cumprido ou até mesmo superado algumas dessas metas. Na Alemanha, Otto Lilienthal efetuou no início da década de 1890 milhares de voos planados descendentes, atingindo com frequência distâncias bem maiores que os 25 metros estipulados pelo Prêmio Archdeacon. E nos Estados Unidos, os irmãos Wright faziam desde 1903 voos cada vez mais longos em planadores motorizados, valendo-se para decolar ora de ventanias, ora de um engenhoso sistema de catapultagem, mas sempre sem qualquer controle oficial. Afinal, estava convencido que Santos Dumont seu admirado compatriota é de fato o primeiro homem a realizar a proeza de alçar voo em um aparelho mais pesado que o ar, sem nenhum artifício, em suas experiências com o Oiseau de Proie (Ave de Rapina).
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